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Duas faces -- Capítulo 9 -- Érebus.




29 de Junho. Sábado.

Assim que acordou, a primeira coisa que Fausto fez foi pegar o porta-retratos que trouxe da casa de Leonardo, tinha deixado no chão ao lado da cama antes de dormir, e deu uma boa olhada nas pessoas que estavam na fotografia; seus olhos passearam por cada detalhe da foto e por todos os rostos em busca de alguma coisa que denunciasse o lugar onde aquela cena tinha sido fotografada. Sentiu-se um pouco incomodado ao esquadrinhar a foto, havia alegria demais sendo demonstrada ali, todas as pessoas sorriam com prazer, como se o mundo fosse o mais perfeito dos lugares, como se aquela árvore em cuja sombra estavam fosse uma das árvores plantadas no jardim do Éden pelo próprio Deus. Achou toda aquela alegria terrivelmente sem propósito e por um momento chegou a pensar que todos deveriam estar fingindo; não era possível que pessoas conseguissem sentir tanta alegria quanto o que estavam demonstrando, mas por outro lado, o fingimento era uma emoção com a qual Fausto tinha muito mais intimidade e compreendia muito melhor do que a alegria. Fingir, assim como ludibriar e dissimular eram as características mais comuns às pessoas de todo o globo terrestre. Ao menos essa era a opinião dele.
Durante todo o tempo que esteve aprisionado, a única vontade que havia conseguido sustentar era a vontade de liberdade e o único sentimento que nutriu durante todos os longos anos que passou na escuridão foi a amargura, uma amargura incomoda, pungente e permanente, mas agora que estava livre tinha substituído aquele sentimento por uma coisa mais útil. Ódio; um ódio incontrolável e visceral direcionado principalmente para Mônica e Ricardo, mas que certamente já havia se espalhado para outras pessoas também.
Fausto odiava todos os outros seres humanos por vários motivos que para ele faziam todo o sentido; primeiro por causa da alegria; ele se perguntava como pessoas num mundo tão imperfeito e triste podiam ser alegres; fingimento, dissimulação e mentira eram as únicas respostas que ele tinha em mente e que cria poder se encaixar como explicação plausível.
Fausto também detestava os outros por causada hipocrisia latente em cada ser humano, ao contrário dele, os homens e mulheres faziam esforço constante para negar suas verdadeiras naturezas, escondiam os sentimentos mais poderosos e primitivos como a ira, a luxúria e a maldade; fingiam que aquelas coisas não faziam parte da natureza humana e as praticavam em segredo. Mantinham todas as suas depravações mais bizarras muito bem protegidas por trás de máscaras de moralidade puritana.
Outros se doutrinavam para empurrar seus sentimentos, que para Fausto eram a essência da raça humana, para dentro e para o fundo de suas almas, aprisionando-os em celas obscuras como as que ele mesmo teve de suportar durante grande parte de sua vida. Na cabeça de Fausto se o Homem, ou seja, a humanidade, admitisse quem ele realmente era, e usasse todos as suas mais poderosas características, como a violência extrema e, com a força subjugasse todos os sentimentalismos fracos como a alegria fingida; futuramente, o que restasse da raça humana poderia desfrutar de um período de total plenitude austera. Obviamente que seria preciso, antes, passar por um interregno de purgação, onde os fracos e os que não quisessem aceitar sua natureza preferindo viver as farsas e mentiras de uma vida medíocre seriam extirpados de todas as formas possíveis do meio social. Uma nova sociedade nasceria das cinzas da sociedade atual corrompida, mas que insiste em dizer que está em processo de constante evolução. Mentira.
Fausto sabia que ele mesmo jamais conseguiria fazer com que aquela sua utopia brotasse, nem tinha a intenção de se contrapor abertamente a tudo e todos, não era tolo, mas daria sua pequena contribuição para que, quem sabe num futuro, mesmo que distante, as pessoas percebessem que de dentro do caos poderia surgir homens e mulheres mais perfeitos, fortes; uma sociedade inteira de pessoas mais conscientes das realidades ao redor e que não escondessem suas características mais belas por detrás de moralismos descabidos.
Por hora ele iria se contentar em fazer com que sua utopia fosse realidade em sua própria vida. Faria com Mônica exatamente como fez ao irmão dela e pretendia atormentar aquela família da fotografia como um bônus para si mesmo pelo simples fato de terem sido capazes de fingir, segundo ele, tamanha felicidade, Fausto pretendia fazer com que cada um deles conhecesse o pavor e a loucura que era o mundo real. E quem sabe se algum deles não poderia resistir e se tornar uma pessoa muito melhor. O caminho era a dor e o sofrimento, mas para muitos só a morte servia.
Se existia algo que ele gostava de ver era o pavor nos olhos e nas vidas das pessoas e isso ele faria questão de mostrar para cada uma delas; fora isso, havia a questão daquele jovem especial que ele viu no parque de diversões. Ele era diferente dos outros, muito mais parecido consigo do que poderiam imaginar e tentaria fazer com que ele enxergasse as coisas pelo mesmo ponto de vista seu.
No princípio não pensava em fazer concessões em suas intenções nem tinha muitos objetivos existenciais, mas quando percebeu que algo diferente estava acontecendo, ou seja, Fausto passou a ter controle sobre parte da realidade em seu redor, soube que aquilo não era por acaso e concluiu que deveria usar suas forças para outros propósitos também; por isso, não podia desperdiçar alguém como aquele jovem, além do mais Fausto sentia algo dentro de si que o dizia para se aproximar do outro jovem; algo o impulsionava e mesmo de modo tênue deixava impressões de que aquele outro era importante para a sua própria existência no futuro. Era como se o caminho de ambos estivesse ligado por alguma força senciente que os estava gradativamente aproximando um do outro.
Depois de acertar suas contas com todos eles decidiria qual seria seu próximo passo. As únicas certezas que tinha era que devia eliminar Mônica para não ter mais de se preocupar com Ricardo e fazer com que o outro jovem especial comprasse suas idéias. Porém se não fosse possível o eliminaria também porque de alguma forma ele poderia representar uma ameaça ao próprio Fausto, afinal, pessoas com forças tão maravilhosas agindo em suas vidas só podem se enquadrar em duas categorias; ou são luz ou são sombras.
Fausto se considerava uma Sombra.
Durante toda a noite e madrugada dormira como um bebê, um sono sem sonhos muito parecido com aqueles que teve em seus muitos anos de exílio e prisão. Estava sem blusa nem calça e seu único traje de dormir era um short curto de malha sintética e meias soquetes finas.
Levantou-se da cama com o porta-retrato ainda na mão, o sol entrava pela janela e ele abriu totalmente as cortinas permitindo uma quantidade muito maior de luz penetrar no quarto, mesmo com o céu parcialmente nublado daquela manhã ainda havia luz e claridade abundante por todos os lados; na prisão a única luz que ele podia ver era a produzida pelo archote que quase não era suficiente para coisa alguma. Adorava a luz do sol, mas não dispensava a boa e velha escuridão também; muitos sentimentos e preferências antagônicas como estas conviviam harmonicamente no interior de Fausto. Tinha dormido como uma criança, um sono totalmente ausente de sonhos exceto por uma tênue lembrança de Ricardo, Mônica e do rapaz do parque de diversões. Pareceu ter sonhado com eles no decorrer da madrugada, mas como sempre acontecia, ele jamais se lembrava dos sonhos que por ventura tinha; para ele aquilo não era nada incomodo, pelo contrário, era sempre muito prazeroso. Dormir era como descansar no esquecimento.
Na cabeça de Fausto não havia problema algum em Mônica ter abandonado Ricardo, mas ele considerava que aquela mulher era propriedade sua e, portanto, devia recuperá-la, mesmo que fosse para usá-la mais algumas vezes e matá-la em seguida, ou, matá-la imediatamente como punição pela fuga.
Desde que passara a andar no mundo externo completamente livre ele havia visto um número enorme de mulheres que se encaixavam muito bem em seus padrões de preferências e algumas até que excediam; via mulheres atraentes nas ruas, nas lojas, na televisão, nos transportes públicos e por toda parte, poderia substituir Mônica com extrema facilidade. Ela não significava nada para ele e só tinha certeza de uma coisa. Ia impor uma punição, sobre ela, das mais violentas que conseguisse.
Durante algumas noites e madrugadas de sono Fausto costumava ter a sensação de que na verdade ele não dormia, mas sim abandonava seu corpo numa espécie de estado de torpor transitório retornando apenas na manhã seguinte; não era uma certeza, apenas uma suposição, sentia como se sua consciência fugisse do mundo material, abandonando o próprio corpo e passasse a madrugada vagando sabe-se lá por onde, como um fantasma; talvez em terras oníricas, invadindo sonhos alheios e perturbando pessoas que dormiam ou recolhendo e se misturando com poderosas forças caóticas nos lugares celestiais; forças estas que o estavam inflando cada dia mais com poderes tão surpreendentes que nenhum homem jamais sonhou possuir ou sequer vislumbrou nem em seus sonhos mais delirantes; nem mesmo Fausto sabia ao certo em que grau sua atual capacidade estava. Além disso, havia algo parcialmente perceptível, algo que o estava influenciando para realizar alguma coisa ainda não revelada, mas por mais que Fausto se esforçasse para discernir o que era aquilo, nunca ficava claro, era como uma presença nebulosa, uma nuvem escura, constantemente ao seu redor. Às vezes ele conseguia notá-la, mas outras vezes não. Depois de um certo tempo passou a não ligar mais para aquilo, afinal, alguém como ele que estava gradativamente se tornando mais diferenciado a cada dia devia possuir algo especial a seu redor; Provavelmente descobrisse o que era no momento certo, mas até lá ia se concentrar nas tarefas que já tinha se predisposto a realizar.
Toda manhã Fausto sentia-se melhor, mais revigorado e com mais vitalidade do que no dia anterior e naquela manhã em particular ele estava se sentindo muito mais livre e capaz do que um dia antes, tinha certeza de que poderia encontrar Mônica e dar a ela a punição que merecia. Ele olhou para a foto novamente e para o rosto sorridente da ex-mulher de Ricardo. Detestou aquele sorriso vibrante e iluminado.
“Falsa!” _ pensou consigo mesmo.
Colocou o porta-retratos sobre a cama, o quarto estava desarrumado ao extremo, um verdadeiro caos; foi até o banheiro que ficava quase de frente para a sala e logo que entrou olhou no espelho, viu sua própria imagem refletida. Era o único espelho ainda intacto na casa. Odiava sua imagem.
Ele não se reconhecia naquele rosto embora fosse seu também, mas não era um rosto que ele gostasse, achava sem expressão, sem força, como um mero rosto exatamente igual ao de qualquer outra pessoa, talvez fosse amigável demais. Isso o incomodava porque Fausto jamais se considerou uma pessoa comum ou amigável, e de fato não o era; pelo contrário, ele sempre se considerou algo acima do normal, acima do comum, sobrenatural. Tinha todo aquele poder de mudar e moldar uma parte da realidade segundo sua vontade e a coisa parecia estar aumentando a cada dia. Suas forças estavam recebendo influência, sendo insufladas por algo grandioso e aquele rosto comum não era condizente com o dom poderoso que possuía nem com a grandiosa expectativa que o rodeava.
Tocou com as pontas dos dedos à face e examinou a si mesmo por alguns minutos, seus olhos, testa, nariz, boca e queixo. Não tinha jeito, ia ter que se acostumar com aquilo, afinal, era o único rosto que possuía.
Em seguida abriu a água para lavar o rosto e deixou a torneira derramando uma grossa torrente enquanto ele observava sua mão esquerda. Espalmou a mão bem diante dos olhos e verificou cuidadosamente cada um dos dedos, assim como o pulso, estavam perfeitos, mas na manhã de 16 de Janeiro em que Fausto acordou no quintal de casa, úmido por causa da tempestade do dia anterior, recém saído da prisão no exílio das sombras, com a casa toda revirada; todos os utensílios da cozinha, da sala e do quarto destruídos e sua mão e pulso esquerdo completamente inutilizado, as coisas não fizeram muito sentido.
Felizmente, ao contrário de Ricardo, ele, Fausto, era destro. Mas teve de procurar um serviço médico para remediar os dedos destroncados, o pulso quebrado e o nariz também, além de receber alguns outros curativos nas costas e pernas. Fausto ainda não tinha idéia das coisas incríveis que podia realizar só com a vontade de sua mente e, portanto apenas seguiu para uma unidade de pronto atendimento como uma pessoa comum faria. Lá, recebeu o tratamento adequado, teve seus dedos recolocados nos devidos lugares e o pulso imobilizado. Foi colocado um gesso que ia da mão até pouco abaixo do cotovelo e recebeu também medicação para aliviar as dores, embora não estivesse sentindo nenhuma, o braço estava praticamente amortecido e todas as articulações daquele membro permaneciam inchadas.
O posto de saúde no qual foi atendido ficava a cerca de três quilômetros de casa e ele percorreu toda a distância andando a pé como se estivesse indo comprar pão, prestando atenção em absolutamente tudo ao seu redor; às pessoas, nos carros, nos ambientes e em tudo. Fausto não tinha problema algum para se situar, ele possuía absolutamente todas as memórias de Ricardo; tudo que o outro conhecia, Fausto também conhecia; tudo o que o outro sabia, Fausto também sabia, à exceção de algumas poucas coisas. Era seu primeiro dia cem por cento fora da prisão de sombras na qual permanecera desde sempre, exceto por algumas breve escapulidas esporádicas para se relacionar com Mônica ou para resolver algo pendente que Ricardo não era capaz de lidar; quando preso, só podia ver o mundo exterior pelos olhos de Ricardo que nada mais era do que a sua outra personalidade. E mesmo assim não era sempre que conseguia enxergar através dos olhos do outro; na maioria do tempo tudo em sua vida se resumia em um grande vácuo.
Quando saiu, tudo ao seu redor era maravilhosamente real, durante a caminhada seus pensamentos foram arrastados por uma correnteza de lembranças produzidas por seu outro eu, Ricardo; uma dessas lembranças era muito mais forte que todas as outras. Mônica. Por um curto segundo Fausto teve a certeza de que ela era o único cabo guia capaz de trazer seu outro eu de volta e mandá-lo para as sombras da prisão novamente, portanto, eliminá-la era uma questão de sobrevivência para ele.
A água na torneira ainda caia se desperdiçando aos montes ralo abaixo enquanto Fausto rememorava seu primeiro dia de liberdade depois de anos de solidão e profunda escuridão no interior da mente de Ricardo, sendo alimentado apenas com os sentimentos moralmente inaceitáveis e os comportamentos reprováveis que iam sendo empurrados para o fundo do seu ser. Fausto e Ricardo eram dois lados do mesmo homem, mas um era a pessoa em si, e outro era uma personalidade deturpada que poderia nunca vir à tona, mas que por uma sucessão incomum de combinações acabou se tornando mais forte do que a personalidade dominante original e com isso tomou definitivamente o seu lugar. Fausto assumiu o corpo de Ricardo empurrando a personalidade normal para o lugar onde antes ele estava aprisionado.
Talvez se Ricardo tivesse aceitado a ajuda de Mônica e procurado tratamento psicológico adequado quando ela estava disposta a passar por qualquer coisa com ele; certamente seria diagnosticado como sendo portador de transtorno dissociativo de identidade, comumente chamado pelos médicos de Transtorno de múltiplas personalidades. Caracterizado pela condição mental onde um único indivíduo demonstra características de duas ou mais personalidades ou identidades distintas cada qual com sua maneira particular de perceber e interagir com o meio social e o mundo ao seu redor.
Ricardo tinha Fausto como outra personalidade, mas Fausto por si só não tinha força suficiente para sair e tomar o controle por completo e em tempo integral; ele só tomava o controle eventualmente e em ocasiões muito especificas quando por algum motivo Ricardo não conseguia lidar com alguma circunstância demasiadamente embaraçosa ou estressante de seu dia a dia. Porém Fausto a cada ano fazia mais e mais força para sair e ser ele a personalidade dominante, mesmo sem força no começo ainda era capaz de produzir as sensações e os sentimentos que começaram a assustar Ricardo. Fausto era como um fantasma aprisionado na garrafa, sem força para fugir, mas com força suficiente para assombrar o dono da garrafa.
As vozes que Ricardo ouvia no começo do que ele julgava ser seu processo de insanidade era Fausto falando com ele, mas com o passar do tempo outra coisa aconteceu, uma segunda voz passou a permear a vida de Ricardo e isso somado as investidas de Fausto para sair de seu aprisionamento escuro foram preponderantes para abalar o estado psicológico do verdadeiro dono do corpo definitivamente, criando rupturas.
Com a mente afetada pelo que ele julgava serem delírios, mas que na verdade eram pensamentos de Fausto dentro de sua cabeça rivalizando com os seus próprios pensamentos, o equilíbrio mental de Ricardo foi se esfacelando pouco a pouco como um espelho rachando paulatinamente; criando uma brecha psicológica por onde Fausto podia sair com muito mais freqüência, embora só fosse capaz de fazê-lo totalmente durante os momentos de maiores intimidades entre ele e Mônica. Ricardo passou a sofrer de uma disfunção sexual acompanhada por outros sintomas como intensas dores de cabeça, ansiedade excessiva, palpitações, pulso acelerado e algumas outras alterações psicossomáticas.
Fausto por outro lado era capaz de satisfazer sexualmente a ambos, ele e a mulher que no princípio não sabia da troca de personalidade e foram justamente aquelas relações com a mulher de Ricardo o cabo guia para a saída definitiva dele desde as brumas mentais até o mundo externo, mas não sem uma segunda ajuda externa, ominosa e profana que ele ainda ignorava.
Mônica tinha sido a porta pela qual Fausto emergira das trevas mentais e peculiarmente era também a única forma de Ricardo voltar ao controle de seu corpo. Fausto sabia que assim como o desejo de possuir aquela mulher o tinha guiado à liberdade; era possível que o amor de Ricardo para com ela fosse capaz de fazer o mesmo por ele. Por isso era tão importante eliminá-la; matando Mônica, Fausto matava também a única chance de retornar para a prisão e encerrava de uma vez por todas a sua outra personalidade lá para sempre.
Finalmente ele colocou a mão sob a água que saia da torneira e lavou o rosto, em seguida olhou com o máximo de admiração para a tatuagem que mandara fazer no braço. O nome Tânatos, bem legível e com letras clássicas como se tivessem sido escritas por uma pena de algum escritor ou poeta da idade média, a tatuagem se destacava com as formas arredondadas e finas de cada uma das letras; elas pareciam ser um conjunto bem trabalhado de tatuagens individuais, tamanho o esmero com que foram feitas. Futuramente pensava em fazer muitas outras, funcionavam como marcas de individualidade para diferenciar quem ele era, já que não podia se livrar do corpo e do rosto de seu outro eu, então os modificaria segundo sua vontade para torná-los um pouco mais condizentes com a personalidade que agora dominava. Futuramente ele pensava em tatuar algo que representasse um símbolo de poder.
Após lavar o rosto ele voltou para o quarto e colocou as mesmas roupas que vestira no dia anterior, tinha muito a fazer e ia começar o mais cedo possível. Quando terminou de se vestir pegou a mochila que havia trazido da casa de Leonardo e de dentro dela retirou o telefone celular que pertencera ao morto.
Verificou na tela do aparelho que havia duas chamadas não atendidas e quando as listou viu que pertenciam a alguém identificado como “irmã”, foi até a agenda numérica e não demorou muito até encontrar um número que estava relacionado com o nome “irmã” na lista. Não teve dúvidas, era o número de Mônica. Ela devia ter ligado para o irmão na noite passada enquanto Fausto dormia, por isso não ouviu o aparelho chamando.
Antes de ligar para aquele número e se certificar ele espalhou as outras coisas de dentro da mochila sobre a cama.
Notas de real caíram sobre a cama, quatro notas de cinqüenta, dez notas de vinte e dez notas de dez. O relógio também caiu na cama, era um belo relógio e Fausto colocou no braço logo que terminou de verificar todas as coisas. Caíram também as duas armas e a munição que ele recolheu na casa de Leonardo; Fausto municiou ambas as armas e resolveu que usaria uma delas muito em breve. Fora tudo aquilo também tinha as chaves da casa de Leonardo e pretendia usá-la também para armar uma emboscada para Mônica. Finalmente juntou todas as coisas na mochila novamente exceto o dinheiro que colocou em sua própria carteira, jogou os cartões de crédito fora porque embora pertencessem a Ricardo, ele Fausto, jamais poderia usá-los, não era capaz de assinar o nome do outro e tampouco possuía uma caligrafia igual, de fato, suas letras eram completamente diferentes, talvez pelo fato de um ser canhoto e o outro destro. Ficou apenas com os cartões de débito para movimentações em caixas eletrônicos onde pretendia retirar o máximo de dinheiro que pudesse.
Com poucos toques no menu do telefone celular, um antigo Motorola c650, ele ligou para o número indicado com a nomenclatura “irmã” e aguardou alguns instantes.
Primeiro toque e nada, segundo toque e também nada, mas ao terceiro toque alguém atendeu do outro lado da linha, a voz feminina parecia parcialmente atrapalhada provavelmente pelo sono matutino interrompido, mas não deixava dúvidas; era a voz de Mônica.
_O que foi Léo, você me acordou!_ Disse a mulher com um tom severo no som da voz.
Fausto não disse nada, estava imaginando o rosto dela enquanto acordava.
_Léo_ ela disse_ Liguei pra você ontem, onde estava? Estava trabalhando ou saiu com uma de suas sirigaitas?
_Mônica._ ele disse o nome dela da forma mais melíflua que conseguiu, e aguardou.
Houve um hiato do outro lado, silêncio momentâneo e em seguida a voz dela reapareceu. Fausto se esforçou para imaginar a expressão no rosto da mulher.
_Quem está falando?_era nítida a confusão na voz dela ao estranhar o tom vocal da pessoa com quem falava.
Fausto se apressou:
_ Que bom que encontrei você. Por um momento pensei que não íamos mais nos ver. Estou com saudades.
_ Quem está falando?_ ela repetiu, mas praticamente já tinha certeza de quem era.
_ Ricardo, ora!_ respondeu Fausto.
_Meu Deus!_Ela disse_ Você não é o Ricardo. É o Fausto.
Ele sorriu por ter sido reconhecido. Por um momento pensou que fosse capaz de enganar aquela mulher, mas obviamente tinha subestimado a perspicácia dela ao telefone.
_Meu Deus! Meu Deus!_ ela repetia com uma intensa inquietação_ onde está o Léo? Porque está me ligando desse telefone?_ havia um crescente desespero na voz dela também.
_ Você não achou mesmo que ia me deixar?_ ele rebateu.
_Cadê o meu irmão?_ ela insistiu.
_ Você vai poder vê-lo se vier até casa dele; vou esperar por você para conversarmos.
Mais uma pausa por parte dela antes de falar:
_ De onde você está falando?
_Ora! Estou na casa do Leonardo._ mentiu_ Vim fazer uma visitinha social e espero que você queira se juntar a nós para uma conversa sobre os bons e velhos tempos._ Fausto pretendia ir para a casa de Leonardo assim que desligasse o telefone e lá prosseguiria com o próximo passo.
De repente o chão faltou debaixo dos pés de Mônica; ela perdeu completamente a percepção de que havia um solo firme sob a cama onde estava sentada. Nem bem acordara e já estava sendo açoitada por uma terrível expectativa, ainda não estava pronta para ficar frente a frente com Fausto, na verdade, ela não sabia se um dia estaria pronta para fazê-lo novamente.
Algumas memórias de seu relacionamento brotaram, eram lembranças que se iniciavam doces com o relacionamento que tivera com seu “ex-marido”, um homem que era duas pessoas no corpo de uma. Lembranças que no desenrolar iam se tornando mais fortes e cada vez mais amargas; seu relacionamento foi ficando cada vez mais fora de controle, sobretudo quando ela descobriu a existência de Fausto; Mônica nunca soube se dentro da cabeça de seu “ex-marido” haviam duas mentes ou se uma única mente tinha gerado duas personalidades distintas, e mesmo tendo preferido ficar com ele por algum tempo chegou num determinado momento em que percebeu que já não seria mais possível manter aquela vida se relacionando com duas pessoas ao mesmo tempo; mesmo que seus dois amantes dividissem o mesmo corpo. Fausto e Ricardo eram muito distintos um do outro e se ela insistisse ia acabar ficando louca.
Ricardo estava cada vez mais paranóico e passava os dias dizendo coisas que ela não compreendia e das quais ele mesmo não se lembrava momentos depois; além disso, durante as noites geralmente na cama, Fausto tomava o controle e embora fosse um amante muito mais viril que Ricardo que era geralmente mais comedido e envergonhado; a idéia de continuar com aquilo começou a assustá-la.
Mônica percebia na forma de falar que Fausto desejava muito mais do que somente tê-la em seus braços e satisfazê-la onde seu outro ego não conseguia. Ele a queria como uma espécie de escrava para fins luxuriosos.
Com o passar dos dias suas desconfianças foram se confirmando à medida que em seu relacionamento iam surgindo desvios, inicialmente sutis, mas que certamente apontavam para alguns comportamentos que ela jamais julgara saudáveis, quem sabe onde poderiam parar se ela não tivesse interrompido seus encontros noturnos e abandonado a casa onde morava com ele.
Fausto demonstrava tendências sádicas e Mônica não estava nem um pouco disposta a continuar com aquilo, sob pena de sofrer com fantasias depravadas que para ela eram inimagináveis e violentas.
Fausto falou novamente ao telefone:
_ E então?
Mônica emergiu do lago de memórias no qual estava se afogando.
_Fausto escute_ começou ela tentando ponderar para conseguir algum tempo a fim de decidir o que faria_ Não faça isso. Deixe-me seguir com minha vida, por favor.
Ele sorriu.
_ Precisamos conversar.
_ Não quero mais nada com Ricardo_ ela disse o nome da outra face de Fausto para não causar algum furor desnecessário nele.
Fausto adorou o começo da conversa, pois ainda nem tinha ficado frente a frente com a mulher e já podia notar uma pequena nota de medo temperado com tons de súplica na voz dela; quase se deixou extasiar imaginando o que faria com ela quando se encontrassem novamente. Ainda não tinha definido em sua mente que tipo de sofrimento ia impor a ela, mas sabia que um dia seria pouco para o que ele ia desenvolver, certamente precisaria de dias para se satisfazer completamente e ficaria torcendo para que o corpo de Mônica fosse forte e resistisse o máximo de tempo possível.
_ Se você achar mais conveniente podemos nos encontrar em nossa antiga casa._ Ele recomeçou já tramando o desfecho repentino na conversa_ Fico o dia todo esperando por você.
A casa onde ela havia morado com ele ou eles, visto que eram dois; ela já não sabia mais o que pensar. Não queria voltar naquela casa, não gostaria de voltar.
_ Deixe-me falar com Leonardo, Fausto, por favor._ pediu.
A resposta que ele deu foi seca como um golpe de martelo:
_ Estou esperando._ Fausto desligou o telefone sem dizer mais coisa alguma. Ele sabia que Mônica não queria se encontrar com ele, mas certamente ficaria preocupada com o irmão. E Fausto já tinha parte do plano bem formado na cabeça.
Colocou o aparelho sobre a cama por um instante e contemplou a si mesmo no seu primeiro momento de glória daquele dia. Havia um prenuncio de que tudo sairia como o planejado, muito embora ele não tivesse planejado muitas coisas. Tinha chamado Mônica para se encontrar com ele na casa onde agora estava, a casa que pertencia a Ricardo e onde eles moraram juntos pelo tempo que o relacionamento durou, mas sabia que a mulher não iria direto para lá, se tinha fugido e estava fazendo tanta força para se manter afastada, ela certamente tentaria outras opções antes de atender ao convite de Fausto e ele sabia que opções seriam essas.
Mônica iria procurar por Leonardo, afinal de contas a ligação que recebera vinha do aparelho do irmão. Certamente na cabeça dela deveria estar havendo alguma ligação entre o irmão e Fausto, mas era justamente essa a dúvida que ele desejava incutir na cabeça de Mônica. Ela sabia muito bem do rompimento da amizade antiga de Ricardo e Leonardo e também jamais tinha contado sobre a existência da segunda personalidade de ex-companheiro, portanto não podia entender o porquê do telefone do irmão estar de posse do outro.
Mônica iria até a casa do irmão antes de rumar para a casa de Ricardo e Fausto sabia disso.
Ele caminhou pela casa, ia sair, precisava estar preparado para agir no momento em que a oportunidade se apresentasse diante de si e algo dentro dele dizia que a oportunidade seria ainda muito melhor do que ele podia imaginar.
Fausto pegou a mochila e saiu da casa, não se preocupou em fechar o domicílio, afinal, quem poderia querer roubar algo de sua casa, não havia praticamente nada inteiro para ser roubado e, além disso, seria muito pior se Fausto voltasse para casa e encontrasse alguém bisbilhotando. Pior para o outro é claro; Ele chegava até a desejar intimamente que isso acontecesse, porque assim teria como testar até onde suas habilidades metafísicas podiam alcançar, ainda não estava acostumado cem por cento com tudo o que descobriu que podia fazer e a cada dia parecia poder fazer mais, porém sem um bom teste de campo não saberia com exatidão toda a extensão de suas “forças extras”.
Antes de sair de casa ele recolheu o bibelô em forma de anjo que Mônica tanto gostava, estava caído num canto da casa há meses. Ele o colocou dentro da mochila também, junto com o porta-retratos que continha a fotografia detestável.
Quando saiu de casa caminhou pelo quintal da frente até o portão e assim que se aproximou dele viu algo que lhe chamou a atenção mais do que devia.  Sob o portão caminhando lentamente estava uma criaturinha bizarra, um besouro cuja carapaça parecia estar deformada; o inseto se parecia muito mais com uma anomalia da natureza do que com uma criatura criada com um propósito natural. Tinha o tamanho de um mouse de computador, as patas frontais eram muito maiores que as outras posteriores e sobre a couraça irregular havia inúmeras protuberâncias parecidas com espinhos, na cabeça estava dois grandes chifres, um maior e outro menor um frente ao outro e duas antenas semelhantes as de uma barata; era como se o inseto tivesse sido construído de partes mortas de outros insetos.
O besouro-barata tinha uma cor forte, bronze, como se sua carapaça tivesse sido confeccionada artesanalmente em alguma fundição do metal. De repente a parte superior da carapaça se fendeu e se abriu afastando-se em duas partes uma para direita e outra para a esquerda; de baixo da proteção surgiram pequenas asas de inseto, mas também elas não pareciam ter sido feitas para aquele monstrinho, eram como asas de mosca, só que muito maiores do que deviam; transparentes como se fossem de plástico filme. O inseto as moveu freneticamente e o som produzido foi como o som de uma abelha ou grande vespa, mas não saiu do chão e em seguida escondeu as asas sob a carapaça de bronze e continuou seu caminho vagarosamente. 
Por um ou dois minutos Fausto não conseguiu desviar os olhos da pequena criatura que parecia oriunda de um pântano ou qualquer outro lugar inóspito, ele sabia que a cidade não era lugar para seres como aqueles assim como os peixes estranhos de profundezas oceânicas jamais nadam nas águas da superfície. Mas não entendia como aquele ser tão insignificante estava exercendo uma atração tão profunda sobre ele; o besouro se movia desajeitadamente e muito devagar, Fausto observava e por um curto momento ele perdeu a noção do restante do mundo a seu redor, sem entender a causa de tudo aquilo.
Procurou lembrar se Ricardo tinha qualquer tipo de atração ou aversão demasiada que justificasse aquele transe em sua mente, mas pelo que conhecia de seu outro eu, não havia nada nesse sentido que pudesse explicar aquilo. Ricardo não sentia absolutamente nada por insetos, na verdade não gostava deles, mas não era algo como uma fobia incontrolável.
Assim que o transe inexplicável terminou Fausto conseguiu retomar sua presença de espírito para desviar o olhar do pequeno monstro que caminhava desligado do mundo. O mais estranho era que a cada dia a mente de Fausto ficava mais forte e de repente um simples inseto havia vencido sua força de vontade facilmente; a simples presença do besouro tinha derrubado as barreiras que mantinham a mente dele atenta na realidade ao redor e o havia aprisionado tão facilmente que Fausto quase chegou a sentir medo. Pensou em pisar no besouro apenas para satisfazer sua vontade de punir o inseto pela petulância de existir, mas quando se deu conta o besouro não estava mais lá, devia ter levantado vôo e ido para outro lugar ou tinha sido arrebatado de volta para a dimensão da qual pertencia. Foi o que ele pensou.
Fausto saiu portão a fora procurando se esquecer da pequena anomalia natural que aprisionara sua atenção; precisava estar totalmente focado nas coisas que tinha para fazer.

***
Mônica colocou o telefone sobre a cama sentindo uma pontada emocional que lhe fustigava o coração; de alguma maneira Fausto a tinha descoberto e agora queria tentar fazer com que as coisas voltassem a ser como antes.
Rapidamente ela saltou da cama e trocou suas roupas, não pretendia tomar o café da manhã com Patrícia e a família, tinha de ir para a casa de Leonardo o mais rápido possível; precisava falar com o irmão, esclarecer como e por que o telefone dele estava de posse de Fausto.
“Será que ele se revelou?”_ pensou Mônica, mas logo em seguida desistiu dessa idéia. Leonardo jamais acreditaria que Ricardo possuía uma segunda personalidade por mais provas que pudessem ser apresentadas. O irmão de Mônica era uma pessoa de visão curta para uma série de coisas e achava que grande parte dos ditos distúrbios mentais eram na verdade engodos bolados por psicólogos, psiquiatras e terapeutas apenas para fazer com que as pessoas gastassem verdadeiras fortunas em suas mãos, fazendo anos de intermináveis tratamentos. Ele também achava que outra parcela das pessoas ditas portadoras desses distúrbios eram pessoas escondendo sua própria maldade por trás de falsas insanidades; segundo ele, o mundo podia tolerar qualquer atrocidade desde que ela viesse de uma pessoa dita desequilibrada, mas ninguém queria enfrentar o fato de que qualquer pequena maldade fosse praticada por alguém em perfeitas condições mentais. Aceitar esse fato seria como olhar no espelho e ver um demônio todas as manhãs.
Mônica saiu da edícula onde estava hospedada e passou rapidamente pela casa da frente; viu Patrícia preparando o café da família com o telefone na mão.
_ Já vai sair?_ perguntou a prima apoiando o telefone no ombro.
Mônica parou para falar com a outra, mas a pressa era evidente ali.
_ Vou à casa de Leonardo.
_ Aconteceu alguma coisa?_ a preocupação brotou instantaneamente no rosto de patrícia e era genuína.
_Não. Creio que não; só quero esclarecer algumas coisas com ele, acho que Ricardo esteve lá me procurando ontem.
A prima arregalou os olhos.
_ Quer que Heloi leve você de carro até lá?
_ Não, eu vou e volto rápido.
De repente querendo desconversar e parecer menos tensa Mônica perguntou:
_ Está fazendo o quê?
Com um sorriso refrescante Patrícia disse:
_ Estou ligando para Ângelo, Heloi finalmente comprou o presente que Ingrid queria dar e vou ver se ele pode dar uma passadinha aqui mais tarde.
Mônica concordou meneando a cabeça.
_ Preciso ir._disse._ mas volto logo.
_Certo; estamos pensando em pegar a estrada e ir à praia passar o Domingo lá. Vamos hoje à noite para não pegar trânsito e teremos todo o domingo para relaxar; acho que você deve ir.
_ Está combinado então._ Mônica finalmente se afastou e saiu.



(Ir para capítulo 10)

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